Previdência social e juros da dívida são os itens que mais consomem a arrecadação média mensal de cada brasileiro
O Brasil ocupa a 15ª posição no ranking dos países com a maior carga tributária, com o equivalente a 35,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Nos últimos anos, a análise dos valores absolutos, referente ao que cada cidadão paga em impostos por mês, tem demonstrado alguns indícios mais apurados sobre a temática da administração pública. Com base no cálculo do chamado condomínio Brasil, que considera a divisão do valor bruto arrecadado — cerca de R$ 1,3 trilhão, ao ano — pelos 200 milhões de habitantes do País, a União passa a dispor de apenas R$ 657,00 mensais por cidadão. A quantia também indica que o custo dos impostos representa 43,8% do salário médio nacional estimado, atualmente, em R$ 1,5 mil.
Além disso, quando descontados os valores destinados ao pagamento de juros da dívida líquida e os repasses para a previdência – que juntos somam 57,8% da arrecadação mensal per capita – e os gastos com a máquina pública sobram apenas 13,2% do PIB para a cobertura de serviços básicos como saúde, educação e segurança. Em caráter de comparação, enquanto países da Europa destinam em média R$ 380,00, por habitante, em educação, o Brasil mantem 43 milhões de alunos matriculados com somente R$ 95,00 mensais.
O mesmo critério pode ser utilizado para a manutenção de um sistema de saúde com acesso universal, à exemplo do SUS, com R$ 80,00 mensais por habitante. Na Noruega, onde a renda média por trabalhador chega próxima ao nível de R$ 10 mil, são investidos R$ 900,00 por habitante em saúde.
Por isso, na avaliação do supervisor de desenvolvimento organizacional da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz), João Batista Mezzomo, a simples comparação dos valores relativos à representatividade da carga tributária sobre o PIB pode esconder ou desconsiderar alguns aspectos importantes. “É de senso comum que o Brasil possui uma das maiores cargas tributária do planeta. Entretanto, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), com a concentração de riqueza brasileira, e os valores disponíveis para que o País conseguisse equipara os serviços prestados por países mais desenvolvidos seria preciso investir 106% do PIB, o que é proporcionalmente impossível”, argumenta.
Em sua palestra no IV Seminário de Cidadania Fiscal, promovido pelo governo do Estado do Rio Grande do Sul, na tarde de ontem, em Porto Alegre, Mezzomo ainda amenizou os eventuais efeitos da corrupção sobre a ineficiência dos serviços públicos. Com base em um estudo da Transparência Internacional, as perdas com corrupção no País atingiram R$ 9 bilhões em 2009. Se aplicados ao cálculo per capito de arrecadação, o valor representaria algo próximo a R$ 5,60, ou 0,85% dos R$ 657,00 arrecadados de cada habitante.
“É claro que não se defende a corrupção, mas o valor relativo a esta prática ilícita não seria suficiente e não é determinante para elevar os recursos disponíveis em educação e saúde. Por outro lado, a reprodução deste discurso, constantemente presente na mídia, determina que cada brasileiro se sinta irresponsável por este problema, quando na verdade a solução passaria por melhorias na distribuição de renda”, sustenta. Para Mezzomo, desconcentração das riquezas poderia reduzir “momentaneamente” os lucros das empresas, mas, em longo prazo, as mesmas corporações tendem a se beneficiar do aumento considerável na demanda por consumo.
Na abertura do evento, o titular da Sefaz, Odir Tonollier, também defendeu a fiscalização como forma de otimizar a arrecadação e a gestão de tributos na esfera pública. Neste contexto, o secretário destacou o papel de programas como o Nota Fiscal Gaúcha para incentivar e conscientizar a população do papel dos impostos.
A avaliação do secretário encontra referência nos níveis de informalidade da economia brasileira, que atingem, segundo a consultoria internacional Tax Justice Network, o equivalente a 39% do PIB. O valor, que coloca o País na segunda colocação do ranking, atrás apenas da Rússia, corresponde ao montante que deixa de ser computado e, por consequência, tributado anualmente no Brasil. O dado inclui desde atividades não registradas devidamente, como os serviços domésticos, até a sonegação fiscal em empresas privadas.
Para Lagemann, existem duas saídas possíveis. A primeira implicaria em ampliar os níveis de poupança para gerar um superávit primário consistente e capaz de promover o pagamento dos juros de maneira eficaz para a redução dos estoques da dívida pública. Outra linha, seria a redução de juros básicos da economia, com o objetivo de aumentar os investimentos e as receitas. “Nenhum deles é muito fácil, pois ambos demandam ajustes fiscais mais severos e ninguém está disposto a fazer sacrifícios deste porte. No entanto, a nossa geração de riquezas (PIB) já está bastante pressionada”, comenta.
O economista ainda destaca que os empréstimos, geradores das despesas com o pagamento de juros, são fruto de um endividamento acima do potencial brasileiros, contraído em épocas passadas. Por isso, o item consome, atualmente, uma parcela significativa do que deveria ser, prioritariamente, destinado aos serviços.
“O Estado pode e deve olhar esta questão em termos absolutos. Os EUA têm, pelo menos, cinco vezes mais recursos disponíveis, pois a carga tributária, apesar de menor do que a brasileira (30% do PIB), se refere a uma geração de riquezas na ordem de US$ 15 trilhões. Esse raciocínio, quando feito apenas de maneira relativa não é válido, pois aqui temos menos recursos para atender os mesmos serviços”, afirma.
De acordo com Lagemann, países como Suécia e Dinamarca possuem altas cargas tributárias na relação com seus respectivos PIBs. Entretanto, os recursos acabam voltando de maneira mais qualificada. No Brasil, isso não ocorre, muitas vezes, em razão do papel dos municípios, que chegam a destinar menos de 3% de suas riquezas per capitas ao entendimento dos serviços básicos.
Fonte! Chasque (reportagem) de Rafael Vigna, publicada nas páginas do Jornal do Comércio de Porto Alegre (RS), edição do dia 23 de outubro de 2014.
O Brasil ocupa a 15ª posição no ranking dos países com a maior carga tributária, com o equivalente a 35,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Nos últimos anos, a análise dos valores absolutos, referente ao que cada cidadão paga em impostos por mês, tem demonstrado alguns indícios mais apurados sobre a temática da administração pública. Com base no cálculo do chamado condomínio Brasil, que considera a divisão do valor bruto arrecadado — cerca de R$ 1,3 trilhão, ao ano — pelos 200 milhões de habitantes do País, a União passa a dispor de apenas R$ 657,00 mensais por cidadão. A quantia também indica que o custo dos impostos representa 43,8% do salário médio nacional estimado, atualmente, em R$ 1,5 mil.
Além disso, quando descontados os valores destinados ao pagamento de juros da dívida líquida e os repasses para a previdência – que juntos somam 57,8% da arrecadação mensal per capita – e os gastos com a máquina pública sobram apenas 13,2% do PIB para a cobertura de serviços básicos como saúde, educação e segurança. Em caráter de comparação, enquanto países da Europa destinam em média R$ 380,00, por habitante, em educação, o Brasil mantem 43 milhões de alunos matriculados com somente R$ 95,00 mensais.
O mesmo critério pode ser utilizado para a manutenção de um sistema de saúde com acesso universal, à exemplo do SUS, com R$ 80,00 mensais por habitante. Na Noruega, onde a renda média por trabalhador chega próxima ao nível de R$ 10 mil, são investidos R$ 900,00 por habitante em saúde.
Por isso, na avaliação do supervisor de desenvolvimento organizacional da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz), João Batista Mezzomo, a simples comparação dos valores relativos à representatividade da carga tributária sobre o PIB pode esconder ou desconsiderar alguns aspectos importantes. “É de senso comum que o Brasil possui uma das maiores cargas tributária do planeta. Entretanto, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), com a concentração de riqueza brasileira, e os valores disponíveis para que o País conseguisse equipara os serviços prestados por países mais desenvolvidos seria preciso investir 106% do PIB, o que é proporcionalmente impossível”, argumenta.
Em sua palestra no IV Seminário de Cidadania Fiscal, promovido pelo governo do Estado do Rio Grande do Sul, na tarde de ontem, em Porto Alegre, Mezzomo ainda amenizou os eventuais efeitos da corrupção sobre a ineficiência dos serviços públicos. Com base em um estudo da Transparência Internacional, as perdas com corrupção no País atingiram R$ 9 bilhões em 2009. Se aplicados ao cálculo per capito de arrecadação, o valor representaria algo próximo a R$ 5,60, ou 0,85% dos R$ 657,00 arrecadados de cada habitante.
“É claro que não se defende a corrupção, mas o valor relativo a esta prática ilícita não seria suficiente e não é determinante para elevar os recursos disponíveis em educação e saúde. Por outro lado, a reprodução deste discurso, constantemente presente na mídia, determina que cada brasileiro se sinta irresponsável por este problema, quando na verdade a solução passaria por melhorias na distribuição de renda”, sustenta. Para Mezzomo, desconcentração das riquezas poderia reduzir “momentaneamente” os lucros das empresas, mas, em longo prazo, as mesmas corporações tendem a se beneficiar do aumento considerável na demanda por consumo.
Na abertura do evento, o titular da Sefaz, Odir Tonollier, também defendeu a fiscalização como forma de otimizar a arrecadação e a gestão de tributos na esfera pública. Neste contexto, o secretário destacou o papel de programas como o Nota Fiscal Gaúcha para incentivar e conscientizar a população do papel dos impostos.
A avaliação do secretário encontra referência nos níveis de informalidade da economia brasileira, que atingem, segundo a consultoria internacional Tax Justice Network, o equivalente a 39% do PIB. O valor, que coloca o País na segunda colocação do ranking, atrás apenas da Rússia, corresponde ao montante que deixa de ser computado e, por consequência, tributado anualmente no Brasil. O dado inclui desde atividades não registradas devidamente, como os serviços domésticos, até a sonegação fiscal em empresas privadas.
Economista afirma que solução para eficiência pública passa por maiores sacrifícios fiscais
O economista e professor da Ufrgs Eugênio Lagemann defende que a questão central do debate sobre a eficiência dos serviços públicos básicos passa pela resolução no rombo da previdência. Os níveis atuais superam com folga os valores destinados às áreas de saúde e educação, juntas.Para Lagemann, existem duas saídas possíveis. A primeira implicaria em ampliar os níveis de poupança para gerar um superávit primário consistente e capaz de promover o pagamento dos juros de maneira eficaz para a redução dos estoques da dívida pública. Outra linha, seria a redução de juros básicos da economia, com o objetivo de aumentar os investimentos e as receitas. “Nenhum deles é muito fácil, pois ambos demandam ajustes fiscais mais severos e ninguém está disposto a fazer sacrifícios deste porte. No entanto, a nossa geração de riquezas (PIB) já está bastante pressionada”, comenta.
O economista ainda destaca que os empréstimos, geradores das despesas com o pagamento de juros, são fruto de um endividamento acima do potencial brasileiros, contraído em épocas passadas. Por isso, o item consome, atualmente, uma parcela significativa do que deveria ser, prioritariamente, destinado aos serviços.
“O Estado pode e deve olhar esta questão em termos absolutos. Os EUA têm, pelo menos, cinco vezes mais recursos disponíveis, pois a carga tributária, apesar de menor do que a brasileira (30% do PIB), se refere a uma geração de riquezas na ordem de US$ 15 trilhões. Esse raciocínio, quando feito apenas de maneira relativa não é válido, pois aqui temos menos recursos para atender os mesmos serviços”, afirma.
De acordo com Lagemann, países como Suécia e Dinamarca possuem altas cargas tributárias na relação com seus respectivos PIBs. Entretanto, os recursos acabam voltando de maneira mais qualificada. No Brasil, isso não ocorre, muitas vezes, em razão do papel dos municípios, que chegam a destinar menos de 3% de suas riquezas per capitas ao entendimento dos serviços básicos.
Fonte! Chasque (reportagem) de Rafael Vigna, publicada nas páginas do Jornal do Comércio de Porto Alegre (RS), edição do dia 23 de outubro de 2014.
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