quinta-feira, 24 de março de 2022

ITBI deverá ser baseado no valor pago na compra do imóvel

Entendimento deverá ser replicado por tribunais de todo o Brasil em casos idênticos; Porto Alegre avalia possíveis ajustes
Entendimento deverá ser replicado por tribunais de todo o Brasil em casos idênticos; Porto Alegre avalia possíveis ajustes. Luiza Prado/JC

No fim de fevereiro, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) deve ser calculado com base no valor de mercado. Além disso, foi determinado que, para esse imposto, não deve ser usado como referência valor fixado pelas prefeituras para a base de cálculo do IPTU. Com isso, a apuração do ITBI ganha um novo cenário em muitos municípios do País, em especial, nos grandes centros que adotam essa pauta de modo unilateral e impositivo.

"A decisão trouxe segurança jurídica aos contribuintes na medida em que poderão questionar e afastar avaliação oficial unilateral e que, muitas das vezes, não leva em consideração as especificidades do imóvel transmitido", explica o advogado do escritório Peluso, Stupp e Guaritá Advogados Eduardo Ramos.

Ramos acrescenta que, agora, caberá à prefeitura o exercício de arbitrar, individualmente, cada transmissão por meio de processo administrativo caso queira invalidar o valor da operação. "É uma verdadeira inversão do ônus. Se antes prevalecia a informação da prefeitura, cabendo às partes afastá-la, a partir deste novo entendimento prevalecerá a informação dos contratantes, cabendo, por sua vez, a prefeitura afastar a presunção formada a partir do valor da operação", detalha.

O julgamento se deu sob o chamado "recurso repetitivo", o que significa que o entendimento poderá ser aplicado em casos que tratam da mesma questão nos tribunais de todo o País. A ação faz parte de recurso movido pela prefeitura de São Paulo, contestando decisão do Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo, no qual a corte local entendeu que o ITBI deve ser calculado sobre o valor real da compra do imóvel ou sobre o valor venal do imóvel para fins de IPTU, optando por aquele que for mais caro. Até então, a capital paulista adotava um terceiro índice, que não correspondia a nenhum dos citados pelo TJ.
A decisão da Primeira Seção do STJ acabou sendo divergente tanto do que queria o município de São Paulo quanto da posição que o TJ paulista havia definido, já que restringiu a base de cálculo do tributo ao valor pago na compra do imóvel.

Neste sentido, o relator do processo, o ministro Gurgel de Faria, estabeleceu três teses para o caso. A primeira diz que "a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação".

Já a segunda determina que "o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio".

Por fim, foi definido que o município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido de forma unilateral'. "Verifica-se que a base de cálculo do ITBI é o valor venal em condições normais de mercado e, como esse valor não é absoluto, mas relativo, pode sofrer oscilações diante das peculiaridades de cada imóvel, do momento em que realizada a transação e da motivação dos negociantes", defendeu o ministro.

Faria apontou ainda que, no IPTU, tributa-se à propriedade, lançando-se de ofício o imposto com base em uma planta genérica de valores aprovada pelo Poder Legislativo local, o qual considera aspectos mais amplos e objetivos, como a localização e a metragem do imóvel.

No caso do ITBI - argumentou -, a base de cálculo deve considerar o valor de mercado do imóvel individualmente determinado, afetado também por fatores como benfeitorias, estado de conservação e as necessidades do comprador e do vendedor, motivo pelo qual o lançamento desse imposto ocorre, como regra, por meio da declaração do contribuinte.

O advogado do Baptista Luz Advogados Rafael Peixoto Abal explica que a decisão promete mudar o cenário atual em que, via de regra, tem como responsável por apurar o valor da base de cálculo do ITBI a própria gestão da prefeitura.

Porto Alegre faz reuniões para definir como atenderá decisão do STJ

Conforme a prefeitura, a adesão ao desconto ainda é baixa, mas previsão é de que situação deverá mudar
Em vigor, projeto do Executivo que oferece desconto para regularização de transações imobiliárias antigas vai até o dia 30 de abril. Andressa Pufal/JC

Em novembro do ano passado, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, sancionou projeto do Executivo que reduz para 1,5% a alíquota do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) para a regularização de transações imobiliárias antigas, os chamados contratos de gavetas. A adesão passou a valer no dia 1º de janeiro deste ano e vai até o dia 30 de abril.

O projeto, cujo objetivo é incentivar a regularização das transações imobiliárias antigas, abrange transações imobiliárias realizadas até 31 de dezembro de 2020, que não foram formalizadas nos tabelionatos de registros de imóveis e junto ao Cadastro Imobiliário e Fiscal do Município. Para poder aproveitar o desconto, é preciso também que o imóvel tenha uma estimativa fiscal de até R$ 986 mil, já considerando a UFM 2022. O pagamento poderá ser parcelado em até 12 parcelas, também no cartão de crédito.

Porém, como o julgamento do Recurso Especial 1.937.821/SP possui repercussão nacional, a secretaria da Fazenda da Capital informou que irá estudar o seu conteúdo e não descarta ajustes em relação à cobrança desse imposto municipal.

"Essa decisão é importante e modifica consideravelmente a forma de apuração da base de cálculo do imposto. Vamos analisar seu conteúdo e tomar as providências necessárias no sentido de observarmos o disposto na decisão judicial", afirma o secretário municipal da Fazenda, Rodrigo Fantinel.

A Receita Municipal, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que está realizando reuniões com outras capitais para definir como será atendido o disposto na decisão judicial. 

Mesmo com esse ponto de dúvida, o advogado Rafael Peixoto Abal avalia como positiva a iniciativa da gestão de Porto Alegre, uma vez que deve aumentar a arrecadação com a cobrança do ITBI sobre a transferência de bens imóveis e ao mesmo tempo atualizar o cadastro dos proprietários de tais bens, o que facilita a fiscalização e a cobrança de outras taxas e impostos de competência municipal, como o IPTU.

A medida prevê ainda que o imóvel cuja estimativa fiscal for superior ao limite estabelecido será tributado, até esse limite, com a alíquota reduzida, e sobre a faixa de valor que o exceder, com as alíquotas previstas no artigo 16 da Lei Complementar nº 197, de 21 de março de 1989, e alterações posteriores. "É mais uma iniciativa que busca incrementar a arrecadação do município sem aumentar a carga tributária", sintetiza Fantinel.

O secretário destaca que somente após a regularização do contrato, o imóvel passa a ser de propriedade de quem adquiriu. "Isso confere segurança jurídica ao comprador. Se o imóvel não está registrado no seu nome, o adquirente pode até mesmo enfrentar um processo judicial e perder o imóvel por dívidas do antigo proprietário", alerta.

Abal, por sua vez, acrescenta que ao ter esse contrato de compra e venda do imóvel regularizado, o cidadão é habilitado a realizar a venda imediata do imóvel sem a necessidade da intervenção de terceiros, reduzindo custos e o tempo da operação "Também pode utilizar o imóvel como garantia para obtenção de linhas de crédito com taxas de juros reduzidas e impedir que o seu imóvel sofra algum tipo de penhora ou qualquer outro tipo de restrição na qual sendo o real proprietário não tenha dado causa.", enumera o advogado.

Conforme a prefeitura, a adesão ao desconto ainda é baixa, mas prevê que isso deve mudar na medida em que se aproxima da data limite para solicitar o benefício e adianta que não haverá prorrogação após o dia 30 de abril.

"Há expectativa de aumento de adesão no mês de abril, último mês do programa, mas a prefeitura não está trabalhando com uma previsão oficial em termos de arrecadação. É uma relação ganha-ganha entre o município e o contribuinte que se regulariza, então a expectativa é que o máximo de contribuintes aproveite", ressalta Fantinel.

Além disso, conforme a Fazenda municipal, os contratos de gaveta ocasionam, do ponto de vista cadastral, uma série de custos de conformidade à Capital. "Esses custos se refletem, inclusive, na cobrança do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), que muitas vezes são realizadas contra quem não é mais o proprietário do imóvel. Do ponto de vista financeiro, repercutem em perda de arrecadação do ITBI, cuja alíquota normal é de 3%, pela não formalização dos negócios", explica o secretário.

Transparência na cobrança já era pauta na Câmara Municipal

Nova lei inverte ônus de comprovar diferença de valor informado
Em outubro do ano passado, Câmara Municipal aprovou o projeto que trata do ITBI
Ederson Nunes/CMPA/Divulgação/JC
Em outubro do ano passado, a Câmara Municipal aprovou o Projeto de Lei Complementar 015/18, que atualiza a Lei Complementar nº 197, de 21 de março de 1989, que trata do ITBI. De autoria do vereador Felipe Camozzato (Novo), o texto inverte o ônus de comprovar a diferença entre o valor informado pelo comprador e o valor avaliado pelo Executivo, do contribuinte para a Receita Municipal. Com isso, acaba conversando com a decisão do STJ, que transfere para o Fisco a responsabilidade de questionar valor declarado mediante processo administrativo.

"O projeto foi feito para sanar o problema de clareza e critérios nas avaliações [na cobrança do ITBI], e foi feito antes dessa decisão do STJ. Então, sim, ele tem uma relação - mas possuem tempos distintos", analisa Camozzato.

A proposta, que já se encontra em vigor, institui a obrigatoriedade de emissão de laudo técnico de avaliação específico para cada imóvel cuja avaliação da Receita Municipal ultrapasse um percentual de 20% do valor efetivo do negócio.

"Um legado positivo dessa lei aprovada é que - com ou sem a decisão do STJ - o contribuinte passou a ter mais informações sobre como é calculado o seu ITBI - sendo um instrumento de defesa do contribuinte contra eventuais erros e abusos que, apesar da decisão do judiciário, podem seguir ocorrendo", pontua.

Na época da tramitação do projeto, conforme o vereador, foi identificado que em 75% dos casos de cobrança do ITBI o valor-base utilizado pela prefeitura para calcular o imposto foi maior do que o valor-base informado pelos cidadãos.

O que é o ITBI?


O ITBI é um imposto municipal que deve ser pago toda vez que houver uma compra, venda ou transferência do imóvel para o nome de outra pessoa. É regulamentado pelo Inciso II do Artigo 156 da Constituição Federal de 1988, sendo o seu pagamento indispensável para concretizar a transferência do imóvel para um novo dono.
 
Quais as vantagens de ter o ITBI regularizado?
 
Ao ter esse contrato de compra e venda do imóvel regularizado, o cidadão poderá realizar a venda imediata do imóvel sem a necessidade da intervenção de terceiros; utilizar o imóvel como garantia para obtenção de linhas de crédito com taxas de juros reduzidas e impedir que o seu imóvel sofra algum tipo de penhora ou qualquer outro tipo de restrição na qual sendo o real proprietário não tenha dado causa.
 
Como regularizá-lo?
 
Para a regularização do imóvel com desconto no ITBI, o contribuinte deve acessar o Portal de Serviços: atendimentofazenda.portoalegre.rs.gov.br (selecionar ITBI > Guias de ITBI > Aplicação de alíquota reduzida) e apresentar três documentos. São eles: formulário, contrato de promessa de compra e venda e matrícula atualizada do imóvel. A guia para pagamento do ITBI deverá ser solicitada diretamente no Tabelionato no momento em que for lavrada a Escritura (antes, portanto, da abertura do processo na Secretaria da Fazenda).

Fonte! Chasque (reportagem) de Nicolas Pasinato, publicado nas páginas do Jornal do Comércio (edição impressa) do dia 23 de março de 2022, no "Caderno JC Contabilidade". Também acessivel no vasto potreiro da internet. Abra as porteiras clicando em: https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/cadernos/jc_contabilidade/2022/03/838776-itbi-devera-ser-baseado-no-valor-pago-na-compra-do-imovel.html