A aposentadoria era um desejo que nunca se realizava. Seu Manuel
sonhava com ela a cada noite. Nas tardes de conversa sob os cinamomos,
tomando mate, falava dela como de um horizonte que abriria as portas do
céu na sua vida: “O homem nasce para tomar chimarrão, criar bem os
filhos e se aposentar”, filosofava. Um dia, quando ninguém mais
esperava, a aposentadoria do Seu Manual chegou como um meteoro. Ele
pegou o seu caniço, no melhor estilo aposentadoria de filme, e foi
pescar na grande lagoa da sua infância. A aposentadoria para ele era
isso: um retorno à infância – que era a lagoa –, à liberdade, aos
prazeres do cotidiano (vadiar, jogar e pescar). Sem dever de casa nem
tabuada ou afluentes do Amazonas. Uma semana depois, entediado e cheio
de dores imaginárias, sonhava com a volta ao trabalho e jurava que seria
readmitido por determinação legal.
– O governador vai requisitar a nossa volta – informava.
Meu amigo Celso Dias se aposentou neste começo de dezembro. Celso é bom de bola – dá chapéus e janelinhas como quem anda de bicicleta (mas eu faço mais gols do que ele), poeta, contista, cronista, tocador de pandeiro, boêmio, namorador e grande leitor. Tenho certeza de que não vai sofrer como Seu Manuel. A primeira medida de Celso depois da aposentadoria mostra que ele é um aposentado com atitude, o que muda tudo e abre um futuro inédito:
– Comprei um skate – disse quando telefonei para cumprimentá-lo.
Acho que ele falou “vou comprar um skate”, mas isso tiraria um pouco da força da decisão. Fiquei babando de admiração. Comentei:
– Isso é que é uma manobra radical.
Celso é um aposentado consciente e responsável. Mostrou o quanto está preparado para essa nova e inquietante etapa da vida:
– Um pranchão, sabe? Um skate de andar pra frente e pra trás.
– Ah, tem isso?
– Tem. E tem aqueles skates pequenos de manobras ousadas.
– Esse vem depois? – instiguei.
– Vai depender da minha evolução.
Acho que ele não falou evolução. Mas fica melhor na crônica, que tem suas leis e não pode ou não deve ser contrariada na sua lógica. Celso vai fazer algo que nunca terei coragem, embora sonhe com isso tanto quanto Seu Manoel sonhava com a aposentadoria: ser skatista. Meu amigo Celso Dias (ele assina também Celso Dias e Noites ou Celso Noites e Dias dependendo da época) domina uma arte em extinção. É, como dizem os franceses, um “causeur”. Décio Freitas, de quem sinto saudades quase todo dia, era um grande “causeur”. O “causeur” é um conversador. Mas não de fiado. Um artista da conversação. Celso reúne quatro condições ideais para a aposentadoria: é “causeur”, “flâneur” (passeador), escritor e leitor.
Imagino Celso dando cursos, dentro de alguns anos, sobre como ser um aposentado feliz. Celso foi meu colega na antropologia e meu aluno na comunicação. Quero ser seu aluno de aposentadoria feliz. Só não me atreverei no skate. Nem no pranchão. Sou tímido. Também não atacarei no pandeiro. Não tenho ritmo. Celso também é bom de samba. Como se aposentou como funcionário público, não será consumido pelo fator previdenciário. A minha visão da aposentadoria depende dele.
– O governador vai requisitar a nossa volta – informava.
Meu amigo Celso Dias se aposentou neste começo de dezembro. Celso é bom de bola – dá chapéus e janelinhas como quem anda de bicicleta (mas eu faço mais gols do que ele), poeta, contista, cronista, tocador de pandeiro, boêmio, namorador e grande leitor. Tenho certeza de que não vai sofrer como Seu Manuel. A primeira medida de Celso depois da aposentadoria mostra que ele é um aposentado com atitude, o que muda tudo e abre um futuro inédito:
– Comprei um skate – disse quando telefonei para cumprimentá-lo.
Acho que ele falou “vou comprar um skate”, mas isso tiraria um pouco da força da decisão. Fiquei babando de admiração. Comentei:
– Isso é que é uma manobra radical.
Celso é um aposentado consciente e responsável. Mostrou o quanto está preparado para essa nova e inquietante etapa da vida:
– Um pranchão, sabe? Um skate de andar pra frente e pra trás.
– Ah, tem isso?
– Tem. E tem aqueles skates pequenos de manobras ousadas.
– Esse vem depois? – instiguei.
– Vai depender da minha evolução.
Acho que ele não falou evolução. Mas fica melhor na crônica, que tem suas leis e não pode ou não deve ser contrariada na sua lógica. Celso vai fazer algo que nunca terei coragem, embora sonhe com isso tanto quanto Seu Manoel sonhava com a aposentadoria: ser skatista. Meu amigo Celso Dias (ele assina também Celso Dias e Noites ou Celso Noites e Dias dependendo da época) domina uma arte em extinção. É, como dizem os franceses, um “causeur”. Décio Freitas, de quem sinto saudades quase todo dia, era um grande “causeur”. O “causeur” é um conversador. Mas não de fiado. Um artista da conversação. Celso reúne quatro condições ideais para a aposentadoria: é “causeur”, “flâneur” (passeador), escritor e leitor.
Imagino Celso dando cursos, dentro de alguns anos, sobre como ser um aposentado feliz. Celso foi meu colega na antropologia e meu aluno na comunicação. Quero ser seu aluno de aposentadoria feliz. Só não me atreverei no skate. Nem no pranchão. Sou tímido. Também não atacarei no pandeiro. Não tenho ritmo. Celso também é bom de samba. Como se aposentou como funcionário público, não será consumido pelo fator previdenciário. A minha visão da aposentadoria depende dele.
Fonte! Este chasque (texto) é de Juremir Machado da Silva, publicado no Sítio Oficial do Correio do Poro de Porto Alegre, no dia 08 de dezembro de 2014. Abra as porteiras clicando em http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/?p=6755
Fonte Retrato! http://novoscfp.com/tag/aposentadoria/
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Nota da O Bolso da Bombacha
Mesmo sendo uma crônica, devemos levar em conta que sempre precisamos, ao longo da vida nos preparar com uma aposentadoria complementar, principalmente que não for funcionário público, pois o benefício do INSS, com certeza será insuficiente.
Valdemar Engroff
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