quarta-feira, 20 de julho de 2022

Defasagem no IR faz quem ganha menos pagar quase 2.000% a mais

Apenas pessoas que ganham acima de R$ 4.670,23 ficariam obrigadas a pagar Imposto de Renda / Katemangostar Freepik.com/Divulgação/JC

 
A falta de correção da tabela do IR (Imposto de Renda), combinada com o aumento da inflação no Brasil, tem gerado um aumento histórico da tributação sobre a população com menor poder aquisitivo.

Essa é a conclusão tirada de um estudo feito pelo Sindifisco Nacional, que representa os auditores fiscais da Receita Federal.
 
De acordo com uma simulação feita pela entidade, uma pessoa que recebe R$ 5.000, após deduções, paga atualmente R$ 505,64 de IR. Se toda a defasagem da tabela fosse corrigida, esse valor cairia para R$ 24,73 -uma diferença de quase 2.000%.
 
Em caso de reajuste, apenas pessoas que ganham acima de R$ 4.670,23 ficariam obrigadas a pagar Imposto de Renda. Isso significa que mais 12,75 milhões de brasileiros estariam isentos do pagamento do tributo, chegando a 23,84 milhões ao todo. Hoje, a isenção é dada ao trabalhador que ganha até R$ 1.903,98.
 
No topo da pirâmide, entre os contribuintes que ganham R$ 100 mil ao mês, a diferença percentual entre corrigir ou não a tabela seria bem menor, de cerca de 5%. A diminuição do imposto pago seria dos atuais R$ 26.630,64 para R$ 25.352,85, segundo a simulação do Sindifisco.
 
"Não corrigir a tabela é uma forma de aumentar o imposto para essa numerosa parcela da população, que, além de arcar com o Imposto de Renda, precisa também lidar com os tributos indiretos, que incidem sobre o consumo", disse presidente do Sindifisco Nacional, Isac Falcão.
 
Mauro Rochlin, economista e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas), destaca que, na medida em que o Imposto de Renda não é reajustado, a inflação acaba onerando mais as pessoas de menor renda porque são as que menos poupam e que menos têm condições de se defender da alta de preços.
 
"A renda dessa pessoa é praticamente toda voltada para consumo e, na medida em que a receita não está acompanhando a inflação, ela é relativamente mais punida do que aquelas que têm maior renda, que podem com o restante de sua renda fazer aplicações financeiras e escapar da alta de preços", afirma.
 
No acumulado de 12 meses até junho, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), índice oficial de inflação no país, chegou a 11,89%. No mês, a inflação subiu 0,67% com alta de alimentos fora de casa e plano de saúde, segundo informou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
 
A inflação de cada período faz uma grande diferença no cálculo da defasagem. Entre especialistas, o congelamento da tabela é visto como uma estratégia política.
 
"A não correção da tabela progressiva do Imposto de Renda é uma forma de aumentar a arrecadação sem que o Poder Executivo tenha custo político associado à majoração de alíquota, por exemplo", disse o vice-presidente do Sindifisco Nacional, Tiago Barbosa.
 
"É só deixar a inflação agir sem mexer nas faixas que a correção monetária da renda auferida pelos contribuintes causa aumento no tributo pago. Ou seja, trata-se de um tributo oculto de que o governo não quer abrir mão", acrescentou.
 
O levantamento feito pelos auditores da Receita mostra que a defasagem da tabela do Imposto de Renda chegou a 147,37%, considerando o período de 1996 --ano em que deixou de sofrer reajustes anuais-- a junho deste ano. Antes, nos anos de inflação descontrolada, a tabela sofria reajuste automático por um indexador, a Ufir (Unidade Fiscal de Referência).
 
Foi no segundo ano do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que a atualização anual deixou de ser feita. A partir da gestão tucana, a correção passou a ser feita de maneira inconstante, como em 2002 e, nos governos do PT, entre 2005 e 2015 -ano mais recente em que houve reajuste.
 
Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), a defasagem está acumulada em 26,6% até junho, de acordo com dados do Sindifisco. O valor está acima de qualquer outro presidente desde a implementação do Plano Real. Segundo a entidade, nenhum outro chefe do Executivo realizou a correção integral da tabela do Imposto de Renda.
 
A tabela de cobrança do Imposto de Renda é a mesma há sete anos, quando o salário mínimo era de R$ 788. Com a previsão de um salário mínimo de R$ 1.294 em 2023, em texto aprovado da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), os brasileiros que receberem R$ 1.941 (1,5 salário mínimo) terão de pagar IR a partir do ano que vem, caso a tabela não seja corrigida.
 
A defasagem faz também com que muitos contribuintes mudem de faixa de renda após reajustes salariais, ainda que abaixo da inflação, e passem a pagar uma alíquota mais elevada em relação ao ano anterior.
 
"O imposto se torna mais regressivo, porque a pessoa muda de faixa salarial sem que tenha tido ganho real de renda. Com isso, ela está sendo mais onerada por força do imposto. Esse é mais um motivo pelo qual a não-correção do Imposto de Renda penaliza as pessoas de menor renda", disse Rochlin.
 
Promover a correção da tabela do IR foi um compromisso assumido por Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018, ainda não concretizado.
 
O projeto de lei da reforma do Imposto de Renda, o PL 2.337 de 2021, defendido pelo ministro Paulo Guedes (Economia), previa a correção da tabela, mas a proposta tinha itens polêmicos, como a taxação de lucros e dividendos. O texto está parado no Congresso. Neste ano, o governo não vê mais espaço para implementar a medida, dizendo haver entraves da lei eleitoral.
 
Fonte! Chasque (post) publicado no sítio oficial do Jornal do Comércio de Porto Alegre (RS), no dia 19 de julho de 2022. Abra as porteiras clicando em https://www.jornaldocomercio.com/economia/2022/07/855960-defasagem-no-ir-faz-quem-ganha-menos-pagar-quase-2-000-a-mais.html

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