sábado, 21 de maio de 2022

Sucessão: VGBL nem sempre é a solução

Idade não é determinante para investir em VGBL visando a sucessão patrimonial

Créditos: https://www.portalcontnews.com.br/pagamentos-do-inss-tem-calendario-alterado-no-carnaval/

A partir de certa idade é natural que as pessoas afortunadas que conseguiram acumular um bom patrimônio se interessem por conhecer as alternativas de sucessão do patrimônio aos herdeiros, fazendo respeitar sua vontade, dentro dos limites legais, e reduzindo os custos de transmissão, sempre que possível. 

A idade é um gatilho para as pessoas começarem a pensar no assunto e é, também, um gatilho para os agentes comerciais ofertarem planos de previdência apresentando argumentos relacionados às características exclusivas do produto, como não participar do inventário e ser isento da incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD).

Hoje eu trago o caso da ML, uma leitora da Folha, que tem sido insistentemente contatada por um agente comercial tentando convencê-la a aplicar os recursos da mãe idosa em um VGBL.

Os argumentos dele focam o produto que quer vender: não participar do inventário e ser isento da incidência do ITCMD; os números: valor estimado de R$60mil de imposto e custo elevado do advogado; e fundamentam a recomendação de investir 70% dos recursos no VGBL.

O entendimento predominante na jurisprudência é o de que um VGBL não deve ser considerado como herança, assim, não integra o inventário dos bens ficando, portanto, livre da incidência do ITCMD (4% no Estado de SP). Isso basta para recomendar a alocação de quase todo o dinheiro disponível? Não.

A idade, embora importante, não é determinante para a oferta e a compra de planos de previdência visando a sucessão patrimonial. Existem outros aspectos a serem considerados.

Vamos ampliar o olhar, enxergar além dos números e do produto, conhecer a pessoa, a dona do dinheiro e seu contexto familiar.

A mãe de ML tem 86 anos de idade e sofre do mal de Alzheimer. O dinheiro em questão representa todo o seu patrimônio e está investido em uma aplicação de renda fixa com liquidez diária.

Os filhos, futuros herdeiros, não vêm problema em pagar o imposto, apesar do alto valor e não têm pressa, podem esperar o término do inventário para terem acesso ao dinheiro, se ainda houver. O custo do advogado não se aplica ao caso dela considerando que um dos filhos é advogado.

Quero ampliar a lista de argumentos e introduzir novos aspectos para que a reflexão e a tomada de decisão de ML e seus irmãos seja a mais adequada.

A taxa de administração do plano de previdência, um percentual anual sobre o capital, pode se equiparar ou ultrapassar o custo do ITCMD que se pretende evitar. E estou assumindo que não haverá outros encargos, como taxa de carregamento ou taxa de saída, que encarecem ainda mais o produto.

Não podemos esquecer da incidência do Imposto de Renda sobre os rendimentos. Considerando a idade avançada e a necessidade de liquidez, o plano seria contratado com o regime tributável que adota a tabela progressiva de alíquotas. O beneficiário do plano pagará 27,5% de IR quando poderia pagar apenas 15% ou nada, se optasse por produtos isentos de imposto.

A liquidez do produto é limitada, só admite resgates a cada 60 dias. Considerando a condição de saúde da matriarca e eventual necessidade de recursos imediatos, o VGBL não é adequado para quem precisa de ampla liquidez.

Depois de avaliar todos esses aspectos, os filhos concluíram ser mais adequado manter o dinheiro em aplicações líquidas, isentas de IR, e pagar o ITCMD na ocasião da transmissão do patrimônio.

Sábia decisão. Muitas vezes é melhor relevar aspectos financeiros, como o custo de inventário e imposto sobre transmissão de herança, e privilegiar os aspectos que conferem segurança, conforto e bem-estar a todos.

Que o dinheiro permaneça a serviço da mãe de ML enquanto ela viver.

Artigo publicado originalmente na Folha de S.Paulo em 16/05/2022

Fonte! Chasque (coluna) de Márcia Dessen, que buscamos no seu Perfil Oficial no Facebook: https://www.facebook.com/marciadessenlivrofinancaspessoais

sexta-feira, 20 de maio de 2022

Ex-faxineira vira uma das maiores empreendedoras de Porto Alegre

Embora os moradores do bairro atribuam suas conquistas à loteria, a dona de diversos negócios na Zona Sul trabalha desde nova


A explicação mais simples que os moradores do bairro Tristeza, na zona sul de Porto Alegre, encontram para o sucesso da ex-faxineira que até hoje não sabe ler nem escrever, mas que é dona de mais de 20 imóveis na região e de vários negócios, é mencionar o boato de que ela ganhou na loteria. Mas isso é uma meia verdade.
 
Maria Clara Muterle Carnaval, 62 anos, mais conhecida como Gringa, de fato, tem uma história com jogos de sorte. Seu marido, ex-motorista do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), Dulcimar Antônio Carnaval, participou de um bolão premiado com amigos há 30 anos. O valor que ficou para ele, no entanto, serviu apenas para que Gringa quitasse as três prestações da casa que faltavam. Tudo que ela conquistou é fruto de muito trabalho, e que ainda não se encerrou.
 
A empreendedora é vista diariamente no restaurante que mantém há 40 anos na rua Doutor Dias de Carvalho, nº 263. “Até hoje, sou eu a que mais funciona na cozinha”, orgulha-se. E não é só na cozinha. Se precisa consertar alguma coisa no telhado ou lavar as telhas, é ela quem sobe e faz o serviço.
ANDRESSA PUFAL/JC
“Se pegar alguém vou gastar para não fazerem bem. Até que eu vá ensinar, faço”, justifica. “Não tenho medo de nada”, emenda.
 
Atualmente, Gringa administra, além do restaurante, uma franquia da pizzaria Arroba e a lancheria Estância do Xis. Uma das filhas, Marilyn, ficou com a clínica de estética Vittá e a outra, Denise, com a lotérica do Zaffari da avenida Otto Niemeyer.
 
Desde cedo, o empreendedorismo faz parte da vida da menina nascida em Antônio Prado, onde tem, ainda, uma cantina. Para ajudar a família, vendia mandolate na estrada. Ao se mudar para a Capital com o marido, começou a fazer faxina. Até que o irmão, na época, ofereceu que ela comercializasse vinhos. E disso veio todo resto.
Arquivo Pessoal/Divulgação/JC
No endereço que abriga até hoje seu restaurante, a venda das bebidas deu lugar a um bar. A esposa de um cliente cadeirante que o deixava o dia inteiro ali, involuntariamente, foi responsável por transformar o empreendimento. Com pena do homem, Gringa lhe servia almoço. Outras pessoas começaram a ver e pedir também, atraídas pelo mesmo cheiro de comida caseira característico do buffet que agora ocupa o local.
Arquivo Pessoal/Divulgação/JC
Não havia sequer mesa para atender a demanda que surgia, mas Gringa empilhava as caixas de cerveja e dava um jeito para equilibrar os pratos. Com isso, vendia erva-mate no Mercado Público, que levava nas costas, já que não tinha carro. “O sucesso rendeu problemas na coluna e um ombro operado”, brinca Marilyn, sobre todas as empreitadas da mãe.
 
Gringa diz que nunca perdeu dinheiro com um negócio seu, apenas emprestando para os outros. Além disso, lembra que o primeiro rancho que fez na vida em um supermercado foi com a quantia que arrecadou ao passar seu sapato de noiva no dia do casamento. Afinal, o que Dulcimar ganhava dava somente para pagar o aluguel e comer.
Arquivo Pessoal/Divulgação/JC
Das lições que ficam sobre ter vários negócios em um mesmo bairro, Gringa cita o fato de poder acompanhar a rotina de cada um deles. “Não me passa na cabeça comprar algo longe de casa. Tenho que enxergar todo dia”, afirma uma das empreendedoras mais diversificadas da cidade, e que, mesmo assim, nunca havia sido citada em um jornal.
 
Para ela, o bairro Tristeza está cada vez melhor, o que a motiva a pensar em novos empreendimentos na área de esportes e de entretenimento. A ideia é trabalhar menos e ganhar mais. A dúvida é saber se ela conseguirá cumprir a primeira parte do objetivo.
ANDRESSA PUFAL/JC