Jovens do Abrigo João Paulo II aprendem a administrar a renda e a planejar a vida adulta
Integrantes do IEE buscam estimular integração para
oportunizar primeira oportunidade de trabalho/Reprodução IEE/Divulgação/JC
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A chegada da maioridade pode ser um drama na vida dos
jovens que vivem nas mais de 400 instituições de acolhimento do Rio
Grande do Sul. Ao completarem 18 anos, eles precisam sair dos abrigos e
enfrentar a vida adulta sem, muitas vezes, terem condições de se
sustentar financeira e emocionalmente. Isso ocorre, em geral, pela falta
de uma maior orientação quanto ao planejamento e à administração da
renda, resultando em gastos que podem prejudicar a poupança para o
futuro.
Instituições como o Abrigo João Paulo II, lar com sede
administrativa em Porto Alegre, que propõem o incentivo à autonomia,
procuram organizar e estimular os jovens para que eles possam ser
inseridos, aos 14 anos, no Jovem Aprendiz e, assim, começar a guardar
valores em conta-poupança. O programa é um incentivo à integração no
mercado e oportuniza a primeira experiência de trabalho. "Temos
adolescentes que saíram com R$ 20 mil, R$ 25 mil, R$ 30 mil e que, hoje,
um ano depois, após a saída do acolhimento, conseguiram, com esse valor
que guardaram, dar entrada na sua casa própria", explica Camila
Monteiro Martins, coordenadora técnica do abrigo. Ela ressalta, porém, a
importância da conscientização quanto aos gastos e aos investimentos
dos adolescentes e de iniciativos que possam colaborar com o seu
desenvolvimento.
Tendo em vista essa questão, o Instituto de Estudos Empresariais
(IEE), reconhecida associação que objetiva a formação de novas
lideranças, realizou, no mês de agosto, a primeira edição do Projeto
Oficinas da Liberdade-Sociedade no Abrigo João Paulo II, que propôs um
debate sobre educação financeira com cerca de 20 adolescentes de 15 a 18
anos incompletos na sede, na avenida Bento Gonçalves. Marcelo Bertuol,
diretor financeiro do IEE, comenta que um projeto semelhante já era
realizado em escolas particulares. "Depois que conhecemos esses lares,
resolvemos aumentar esse projeto e levar para a sociedade que também
necessita", acrescenta.
A atividade teve início com uma proposta de contrapor as noções de
consumo e investimento e promover uma outra visão do dinheiro para criar
um debate acerca da melhor forma de se planejar financeiramente.
Patrícia Bock Bandeira, coordenadora do projeto, explica que o dinheiro
deve ser encarado como um meio que permite o alcance de objetivos e
sonhos. A ideia, portanto, foi expor a necessidade de, ao sair das
instituições, saber administrar a renda obtida durante a experiência nos
cursos profissionalizantes e utilizá-la para um propósito a longo
prazo, como em um curso superior, um aluguel ou uma casa própria.
Os associados, então, levaram exemplos de pessoas bem-sucedidas que
vieram de condições menos favoráveis, a fim de gerar uma aproximação
com a história dos adolescentes. Nomes como Geraldo Rufino e Flávio
Augusto da Silva, empreendedores que tiveram uma infância humilde e
conseguiram prosperar, foram levantados para revelar as possibilidades
da vida apesar das adversidades. A partir daí, houve uma dinâmica
relacionada à eventual saída das entidades de acolhimento, trazendo o
questionamento a respeito do que se pode fazer com aquela renda poupada e
o que se deve fazer com ela. "Teve gente falando em investir em
bitcoin, em ações. Outros falaram em abrir um negócio. Bem surpreendente
até pela faixa etária deles", diz Patrícia.
O intuito dos organizadores era envolver um público maior, mas,
mesmo com os poucos presentes durante a oficina, o impacto de
iniciativas como essa tem um grande potencial. A convivência dos jovens
nas diversas casas-lares é uma forma de trocar experiências, de
visualizar os melhores caminhos, e o futuro de um pode servir de espelho
para o outro. "Ela conseguiu trabalhar, juntar dinheiro. Agora, tem uma
casa e trabalha. Então a gente segue ela como se fosse um exemplo", diz
uma das adolescentes moradoras do Abrigo João Paulo II ao se referir à
irmã de sua colega de quarto, demonstrando essa capacidade de influência
entre eles.
A jovem, que ainda não completou 14 anos, revela também sua
ansiedade para iniciar a trajetória no Jovem Aprendiz, projetando um
futuro no curso de Direito e depois na especialização em Direitos
Humanos. Um sonho comum a tantos outros dentro e fora das instituições
de acolhimento, mas que, para se concretizar, necessita desse auxílio
relativo às questões de planejamento econômico. A atividade, assim,
junto às orientações dadas no dia a dia pelos responsáveis da entidade,
vem para agregar uma noção cada vez maior a respeito da realidade
pós-abrigo.
A primeira edição do Projeto Oficinas da Liberdade-Sociedade dá um
enfoque maior a instituições públicas ou carentes e tem a pretensão de
difundir ideias de empreendedorismo, liberalismo e educação financeira
para promover a autonomia dos adolescentes. Estes que, na maioria dos
casos, não possuem uma referência diferente deles mesmos e têm, na
administração das finanças, um fator determinante para a vida depois do
acolhimento.
A continuidade do projeto é um interesse demonstrado pelo
instituto, que pretende expandir os módulos e trabalhar outros temas.
Marcelo diz que a ideia é estender para outros abrigos e casas-lares
para conseguir atingir um número cada vez maior de jovens.
Fonte! Chasque (reportagem) publicado nas páginas do Jornal do Comércio de Porto Alegre (RS), por João Pedro Rodrigues, no Caderno Empresas & Negócios, na edição do dia 09 de setembro de 2019.
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