No fim de fevereiro, a Primeira Seção do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o Imposto sobre a
Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) deve ser calculado com base no valor
de mercado. Além disso, foi determinado que, para esse imposto, não deve
ser usado como referência valor fixado pelas prefeituras para a base de
cálculo do IPTU. Com isso, a apuração do ITBI ganha um novo cenário em
muitos municípios do País, em especial, nos grandes centros que adotam
essa pauta de modo unilateral e impositivo.
"A decisão trouxe segurança jurídica aos
contribuintes na medida em que poderão questionar e afastar avaliação
oficial unilateral e que, muitas das vezes, não leva em consideração as
especificidades do imóvel transmitido", explica o advogado do escritório
Peluso, Stupp e Guaritá Advogados Eduardo Ramos.
Ramos acrescenta que, agora, caberá à
prefeitura o exercício de arbitrar, individualmente, cada transmissão
por meio de processo administrativo caso queira invalidar o valor da
operação. "É uma verdadeira inversão do ônus. Se antes prevalecia a
informação da prefeitura, cabendo às partes afastá-la, a partir deste
novo entendimento prevalecerá a informação dos contratantes, cabendo,
por sua vez, a prefeitura afastar a presunção formada a partir do valor
da operação", detalha.
O julgamento se deu sob o chamado
"recurso repetitivo", o que significa que o entendimento poderá ser
aplicado em casos que tratam da mesma questão nos tribunais de todo o
País. A ação faz parte de recurso movido pela prefeitura de São Paulo,
contestando decisão do Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo, no qual a
corte local entendeu que o ITBI deve ser calculado sobre o valor real da
compra do imóvel ou sobre o valor venal do imóvel para fins de IPTU,
optando por aquele que for mais caro. Até então, a capital paulista
adotava um terceiro índice, que não correspondia a nenhum dos citados
pelo TJ.
A decisão da Primeira Seção do STJ
acabou sendo divergente tanto do que queria o município de São Paulo
quanto da posição que o TJ paulista havia definido, já que restringiu a
base de cálculo do tributo ao valor pago na compra do imóvel.
Neste sentido, o relator do processo, o
ministro Gurgel de Faria, estabeleceu três teses para o caso. A primeira
diz que "a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em
condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do
IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação".
Já a segunda determina que "o valor da
transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é
condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo
fisco mediante a regular instauração de processo administrativo
próprio".
Por fim, foi definido que o município
não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em
valor de referência por ele estabelecido de forma unilateral'.
"Verifica-se que a base de cálculo do ITBI é o valor venal em condições
normais de mercado e, como esse valor não é absoluto, mas relativo, pode
sofrer oscilações diante das peculiaridades de cada imóvel, do momento
em que realizada a transação e da motivação dos negociantes", defendeu o
ministro.
Faria apontou ainda que, no IPTU,
tributa-se à propriedade, lançando-se de ofício o imposto com base em
uma planta genérica de valores aprovada pelo Poder Legislativo local, o
qual considera aspectos mais amplos e objetivos, como a localização e a
metragem do imóvel.
No caso do ITBI - argumentou -, a base
de cálculo deve considerar o valor de mercado do imóvel individualmente
determinado, afetado também por fatores como benfeitorias, estado de
conservação e as necessidades do comprador e do vendedor, motivo pelo
qual o lançamento desse imposto ocorre, como regra, por meio da
declaração do contribuinte.
O advogado do Baptista Luz Advogados
Rafael Peixoto Abal explica que a decisão promete mudar o cenário atual
em que, via de regra, tem como responsável por apurar o valor da base de
cálculo do ITBI a própria gestão da prefeitura.
Porto Alegre faz reuniões para definir como atenderá decisão do STJ
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Em vigor, projeto do Executivo que oferece desconto para regularização de transações imobiliárias antigas vai até o dia 30 de abril. Andressa Pufal/JC
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Em novembro do ano passado, o prefeito de
Porto Alegre, Sebastião Melo, sancionou projeto do Executivo que reduz
para 1,5% a alíquota do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI)
para a regularização de transações imobiliárias antigas, os chamados
contratos de gavetas. A adesão passou a valer no dia 1º de janeiro deste
ano e vai até o dia 30 de abril.
O
projeto, cujo objetivo é incentivar a regularização das transações
imobiliárias antigas, abrange transações imobiliárias realizadas até 31
de dezembro de 2020, que não foram formalizadas nos tabelionatos de
registros de imóveis e junto ao Cadastro Imobiliário e Fiscal do
Município. Para poder aproveitar o desconto, é preciso também que o
imóvel tenha uma estimativa fiscal de até R$ 986 mil, já considerando a
UFM 2022. O pagamento poderá ser parcelado em até 12 parcelas, também no
cartão de crédito.
Porém, como o
julgamento do Recurso Especial 1.937.821/SP possui repercussão nacional,
a secretaria da Fazenda da Capital informou que irá estudar o seu
conteúdo e não descarta ajustes em relação à cobrança desse imposto
municipal.
"Essa decisão é importante e
modifica consideravelmente a forma de apuração da base de cálculo do
imposto. Vamos analisar seu conteúdo e tomar as providências necessárias
no sentido de observarmos o disposto na decisão judicial", afirma o
secretário municipal da Fazenda, Rodrigo Fantinel.
A
Receita Municipal, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que
está realizando reuniões com outras capitais para definir como será
atendido o disposto na decisão judicial.
Mesmo
com esse ponto de dúvida, o advogado Rafael Peixoto Abal avalia como
positiva a iniciativa da gestão de Porto Alegre, uma vez que deve
aumentar a arrecadação com a cobrança do ITBI sobre a transferência de
bens imóveis e ao mesmo tempo atualizar o cadastro dos proprietários de
tais bens, o que facilita a fiscalização e a cobrança de outras taxas e
impostos de competência municipal, como o IPTU.
A
medida prevê ainda que o imóvel cuja estimativa fiscal for superior ao
limite estabelecido será tributado, até esse limite, com a alíquota
reduzida, e sobre a faixa de valor que o exceder, com as alíquotas
previstas no artigo 16 da Lei Complementar nº 197, de 21 de março de
1989, e alterações posteriores. "É mais uma iniciativa que busca
incrementar a arrecadação do município sem aumentar a carga tributária",
sintetiza Fantinel.
O secretário
destaca que somente após a regularização do contrato, o imóvel passa a
ser de propriedade de quem adquiriu. "Isso confere segurança jurídica ao
comprador. Se o imóvel não está registrado no seu nome, o adquirente
pode até mesmo enfrentar um processo judicial e perder o imóvel por
dívidas do antigo proprietário", alerta.
Abal,
por sua vez, acrescenta que ao ter esse contrato de compra e venda do
imóvel regularizado, o cidadão é habilitado a realizar a venda imediata
do imóvel sem a necessidade da intervenção de terceiros, reduzindo
custos e o tempo da operação "Também pode utilizar o imóvel como
garantia para obtenção de linhas de crédito com taxas de juros reduzidas
e impedir que o seu imóvel sofra algum tipo de penhora ou qualquer
outro tipo de restrição na qual sendo o real proprietário não tenha dado
causa.", enumera o advogado.
Conforme a
prefeitura, a adesão ao desconto ainda é baixa, mas prevê que isso deve
mudar na medida em que se aproxima da data limite para solicitar o
benefício e adianta que não haverá prorrogação após o dia 30 de abril.
"Há
expectativa de aumento de adesão no mês de abril, último mês do
programa, mas a prefeitura não está trabalhando com uma previsão oficial
em termos de arrecadação. É uma relação ganha-ganha entre o município e
o contribuinte que se regulariza, então a expectativa é que o máximo de
contribuintes aproveite", ressalta Fantinel.
Além
disso, conforme a Fazenda municipal, os contratos de gaveta ocasionam,
do ponto de vista cadastral, uma série de custos de conformidade à
Capital. "Esses custos se refletem, inclusive, na cobrança do Imposto
sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), que muitas
vezes são realizadas contra quem não é mais o proprietário do imóvel. Do
ponto de vista financeiro, repercutem em perda de arrecadação do ITBI,
cuja alíquota normal é de 3%, pela não formalização dos negócios",
explica o secretário.
Transparência na cobrança já era pauta na Câmara Municipal
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Em outubro do ano passado, Câmara Municipal aprovou o projeto que trata do ITBI Ederson Nunes/CMPA/Divulgação/JC |
Em outubro do ano passado, a Câmara
Municipal aprovou o Projeto de Lei Complementar 015/18, que atualiza a
Lei Complementar nº 197, de 21 de março de 1989, que trata do ITBI. De
autoria do vereador Felipe Camozzato (Novo), o texto inverte o ônus de
comprovar a diferença entre o valor informado pelo comprador e o valor
avaliado pelo Executivo, do contribuinte para a Receita Municipal. Com
isso, acaba conversando com a decisão do STJ, que transfere para o Fisco
a responsabilidade de questionar valor declarado mediante processo
administrativo.
"O projeto foi feito
para sanar o problema de clareza e critérios nas avaliações [na cobrança
do ITBI], e foi feito antes dessa decisão do STJ. Então, sim, ele tem
uma relação - mas possuem tempos distintos", analisa Camozzato.
A
proposta, que já se encontra em vigor, institui a obrigatoriedade de
emissão de laudo técnico de avaliação específico para cada imóvel cuja
avaliação da Receita Municipal ultrapasse um percentual de 20% do valor
efetivo do negócio.
"Um legado positivo
dessa lei aprovada é que - com ou sem a decisão do STJ - o contribuinte
passou a ter mais informações sobre como é calculado o seu ITBI - sendo
um instrumento de defesa do contribuinte contra eventuais erros e
abusos que, apesar da decisão do judiciário, podem seguir ocorrendo",
pontua.
Na época da tramitação do
projeto, conforme o vereador, foi identificado que em 75% dos casos de
cobrança do ITBI o valor-base utilizado pela prefeitura para calcular o
imposto foi maior do que o valor-base informado pelos cidadãos.
O que é o ITBI?
O ITBI é um imposto municipal que deve
ser pago toda vez que houver uma compra, venda ou transferência do
imóvel para o nome de outra pessoa. É regulamentado pelo Inciso II do
Artigo 156 da Constituição Federal de 1988, sendo o seu pagamento
indispensável para concretizar a transferência do imóvel para um novo
dono.
Quais as vantagens de ter o ITBI regularizado?
Ao ter esse contrato de compra e venda
do imóvel regularizado, o cidadão poderá realizar a venda imediata do
imóvel sem a necessidade da intervenção de terceiros; utilizar o imóvel
como garantia para obtenção de linhas de crédito com taxas de juros
reduzidas e impedir que o seu imóvel sofra algum tipo de penhora ou
qualquer outro tipo de restrição na qual sendo o real proprietário não
tenha dado causa.
Como regularizá-lo?
Para a regularização do imóvel com
desconto no ITBI, o contribuinte deve acessar o Portal de Serviços:
atendimentofazenda.portoalegre.rs.gov.br (selecionar ITBI > Guias de
ITBI > Aplicação de alíquota reduzida) e apresentar três documentos.
São eles: formulário, contrato de promessa de compra e venda e matrícula
atualizada do imóvel. A guia para pagamento do ITBI deverá ser
solicitada diretamente no Tabelionato no momento em que for lavrada a
Escritura (antes, portanto, da abertura do processo na Secretaria da
Fazenda).
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